sábado, novembro 12, 2016

Um canto não é um penálti

Através das redes sociais, está em curso uma perseguição sem tréguas a um jogador de futebol, um cidadão mexicano que trabalha no nosso país. Convém alertar para o facto de que os ímpetos e as discussões nas redes sociais neste século XXI estão para a real notoriedade de qualquer assunto como estavam as tabernas nos séculos passados. A única diferença – e bem trágica, por sinal – é que, antes da revolução tecnológica, quando alguém afirmava "ouvi agora à porta da taberna…" não se dava a menor importância ao dislate. Fosse qual fosse o assunto, cabia-lhe ser remetido para o patamar das vulgaridades irrepetíveis nos salões. 

No tempo presente, não é bem assim que as coisas se passam. Um insulto anónimo, uma insinuação torpe, um perfil falso numa rede social têm peso suficiente para justificar horas de debates em estações de televisão, porque o espírito por definição impune da taberna conquistou o espaço outrora destinado à discussão qualificada. 

A mais recente vítima deste chavascal é o pobre do Herrera, jogador do Porto, porque nos instantes finais do jogo com o Benfica cedeu, um tanto ou quanto disparatadamente, um pontapé de canto de que haveria de resultar o golo com que os tricampeões nacionais selaram um empate que muito desgostou os seus rivais. Esta gente que triunfa todos os dias no Facebook e afins trata agora os pontapés de canto como se fossem penáltis ou, pior ainda, vergonhosos autogolos concedidos para envergonhar as pedrinhas da calçada. No último clássico, o Benfica terá beneficiado de uma meia dúzia de pontapés de canto, cedidos sempre por jogadores adversários, como é das regras do jogo, que não deram em nada, pelo que não houve culpados nem cidadãos a abater online, mas, para desgraça de Herrera, foi do seu alívio desastrado que acabou por surgir o golo do Benfica quando já não havia tempo para recuperar. 

E, por isto, é perseguido pela turba e não há membro da sua família que escape à fúria dos internautas mais ou menos anónimos. No entanto, passada quase uma semana sobre o infausto acontecimento, Nuno Espírito Santo já fez certamente o que tinha a fazer no balneário portista para salvar Herrera e o espírito de grupo. Desenrolou a larga folha imaculada daquele quadro de mestre-escola com que presenteou o País com uma lição de alta psicologia e, sem parar de desenhar, explicou aos jogadores: em primeiro lugar, um canto não é um penálti e, em segundo lugar, um treinador que faz três substituições para o gozo e os aplausos da multidão quando o resultado é apenas tangencial corre sérios riscos de se ver desfeiteado pelos imponderáveis desta vida. É que o Herrera tem orelhas grandes mas não são de burro.


Fonte: Leonor Pinhão @ correio da manha

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