segunda-feira, junho 02, 2014

Obrigado, cidadão, obrigado

Atribuir prémios a quem vota seria estranho, uma vez que estamos muito habituados a não ganhar nada com o voto. O choque seria demasiado grande.

Começam a ouvir-se vozes a favor do voto obrigatório. Mesmo os proprietários das vozes são a favor do voto obrigatório. Se fossem apenas vozes teria menos valor político, embora talvez fosse mais interessante do ponto de vista do esoterismo. O problema é este: os cidadãos têm pouca vontade de votar. Quando a democracia era nova ainda acorriam às urnas em bom número, mas agora as eleições tornaram-se rotineiras e já não os atraem como antigamente. Uma das soluções, acho eu, era apimentar a relação com uma novidade qualquer. Por exemplo, mudar de posição política. 

A maior parte dos eleitores vota sempre da mesma maneira. É natural que o acto eleitoral se torne aborrecido. Por outro lado, os candidatos podiam tornar-se um pouco mais sedutores e atenciosos. Normalmente, pretendem apenas atrair-nos à cabina de voto, e depois passam quatro ou cinco anos sem nos dizer nada. Nem um postal, nem um telefonema, nada. O eleitor sente-se sujo, e não volta a cair na esparrela.

Para evitar a abstinência dos eleitores, há quem proponha o voto obrigatório. Os cidadãos portugueses precisam de um estímulo para cumprir os seus deveres. O problema das facturas com número de contribuinte ficou resolvido por meio da atribuição de prémios; o problema da abstenção pode resolver-se por meio da aplicação de castigos. Faz sentido que os métodos sejam diferentes. Atribuir prémios a quem vota seria estranho, uma vez que estamos muito habituados a não ganhar nada com o voto. O choque seria demasiado grande. No entanto, a aplicação de castigos também acarreta problemas: a multa por não ir votar tem de ser muito avultada, na medida em que os portugueses costumam pagar um preço bastante elevado por ir votar. 

Pagámos quando elegemos as pessoas que criaram o problema do BPN, pagámos quando elegemos as pessoas que criaram o problema da dívida, pagámos quando elegemos as pessoas que criaram o problema do desemprego. A multa tem de ser mesmo muito elevada para que não ir votar nos saia mais caro do que ir às urnas. Caso contrário, a abstenção continua a ser mais atraente.

Pessoalmente, admito a multa para quem não vota desde que se institua igualmente uma multa para quem vota, penalizando o sentido do voto. O cidadão votou duas vezes no Sócrates? Paga uma multa. Votou quatro ou cinco vezes no Cavaco? Paga outra multa. Votou no Passos Coelho? Paga uma multa e faz trabalho comunitário. A ver se estes eleitores aprendem.

Fonte: Ricardo Araújo Pereira @Visão

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