Depois de ter declarado que tinha vergonha de pertencer ao mundo do futebol, o presidente do Sporting deu os parabéns «aos dois presidentes dos dois clubes» com quem passou a partilhar a liderança do campeonato.
Francamente já não sei bem se Bruno Carvalho deu primeiro os parabéns aos outros dois presidentes e se só depois é que declarou ter vergonha de pertencer ao mundo do futebol ou se, pelo contrário, foi pela ordem inversa que falou.
E, na verdade, tanto faz. Já foi há muito tempo, foi há cinco dias.
Devo dizer que quando escrevo estas linhas ainda só se passaram dois dias sobre as declarações produzidas por Bruno Carvalho logo a seguir ao jogo com o Nacional, em Alvalade. Até este momento, nenhum dos dois presidentes citados pelo presidente do Sporting se deu ao trabalho de lhe responder, com ou sem a ironia do costume, à vontade dos fregueses que têm estilos distintos.
Duvido que o venham a fazer, isto se menosprezo da minha parte por Bruno Carvalho que é presidente de um dos grandes de Portugal e, assim sendo, por inerência de cargo, sempre que fala é obrigatório que seja ouvido com a maior atenção nas sedes dos rivais, o que não parece ter sucedido, pelo menos desta feita.
Pressinto ainda que se alguma vez lhe responderem o farão de modo telegráfico. E sem STOPS, como antigamente.
Se queremos manter vivas as mitologias e o folclore do nosso futebol temos de velar pelo cumprir dos preceitos. E, por isso, considero uma grande falta de educação dos dois presidentes não responderem com a mesma abundância ao outro presidente.
Nós cá temos três grandes, é ponto assente. E estes trios sempre funcionaram muito bem em todas as áreas do espectáculo. Lembram-se dos Três Tenores? Eram três, Plácido Domingo, José Carreras e Luciano Pavarotti, certo?
Podiam não cantar sempre todos ao mesmo tempo, havia momentos em que cantava mais um do que os outros mas, entre aqueles três, ninguém ficava sem resposta por muito tempo. E o público adorava.
Esta coisa de deixar Bruno de Carvalho a cantar sozinho não é, portanto, de bom-tom mesmo admitindo, contrariada, que os dois presidentes mudos tenham, muito simplesmente, outras coisas em que pensar e mais com que entreter do que ter de responder a um Rigoletto, que até barítono e não tenor. É desprezo, é classismo? É e sou contra.
Pinto da Costa tem andado atarefado a lançar o seu último livro. Esteve recentemente em Lisboa a fazê-lo e afirmou-se, na ocasião, como «anti-nada» e «de Portugal». Isto quando falava sobre a sua relação com a Capital a propósito da famosa guerra norte-sul que alguns o acusam de ter patrocinado.
Para Pinto da Costa Lisboa já não é Lismá. É Lisóptima.
O importante não é rescrever o nome da cidade, o importante, se entendem, será rescrever a História.
Assim sendo, como é que o presidente do FC Porto pode ter tempo e paciência para responder ao presidente do Sporting se está a começar a ficar francamente preocupado com a sua lenda na posteridade?
No que diz respeito ao presidente do Benfica está ausente do país. Dizem os jornais que Luís Filipe Vieira foi passar o Natal com a família a uma antiga colónia. Nem esteve em Setúbal a ver o jogo da última jornada. A propósito dessa mais do que legítima ausência do presidente, escutei lamentos sinceros de muitos benfiquistas acusando-o de não estar com a equipa em mais uma ocasião.
E lamentos, para quê? Pois se, mesmo nos trópicos, o presidente do Benfica conseguiu sonegar 2 pontinhos ao Sporting enquanto abria uma papaia. É pelo menos esta a opinião do presidente do Sporting. Já o presidente do FC Porto tem uma opinião diferente. Noblesse oblige.
Leonor Pinhão |
Ao Vitória de Setúbal-Benfica assisti sentada à mesa de uma cervejaria numa simpática vila do extremo sul do país. Fazia um frio de rachar lá fora e a rua a principal, tão animada nos meses quentes, apresentava-se desolada. Janelas fechadas em todos os lares, nem uma portada entreaberta que deixasse adivinhar uma luz acesa, nada, só escuridão. Na rua não se via vivalma. É o destino do Inverno dos destinos de Verão.
Na cervejaria estávamos cinco. Eu, sentada, à mesa, como já vos disse. Os demais eram três clientes encostados ao balcão e o patrão, atrás do balcão como lhe competia.
Como normalmente transporto sempre comigo uma esferográfica de pouco valor bastou-me o recurso a um guardanapo de papel, que tinha ali mesmo à mão,para ficar profissionalmente apta a tirar notas. Ou seja, a recolher impressões sobre o jogo, meras gatafunhadas com o propósito de não me vir a esquecer de qualquer coisa de interessante dando-se o caso de acontecer e dando-se também eventualmente o caso de, mais tarde, me apetecer escrever sobre o Vitória de Setúbal-Benfica.
E é esse guardanapo de papel que tenho agora à minha frente quando me preparo para escrever sobre o assunto, tal como previ que viesse a suceder na noite gelada de sexta-feira da semana passada.
A primeira nota reza «1.ª parte» ao alto do guardanapo. E todo esse lado do guardanapo ficou reservado para as ocorrências dos primeiros 45 minutos. Sou metódica, incrivelmente metódica.
A segunda nota, já com o jogo a decorrer, reza «5 chaveiros» e, na verdade, a sua génese nada tem a ver com futebol. Trata-se somente do registo de uma curiosidade. É que, frequentando há tanto tempo aquele local, nunca tinha dado conta de que a sua decoração constava de cinco gigantescos painéis forrados a pano verde onde se alinhavam milhares de porta-chaves, provavelmente oferecidos pelos clientes. Ou isso ou trata-se de um triunfal espólio emoldurado de um coleccionador persistente.
A terceira reza «cachecol» e foi apressadamente redigida já bem perto do intervalo.
Sinto o dever de ter de me explicar. Porque, à primeira vista, uma coisa destas soa de todo inexplicável e até muito pouco profissional. Poderão alguma vez as notas tiradas no decorrer de uma parte inteira de um jogo de futebol resumir-se a supostos criptogramas como «5 chaveiros» e «cachecol»?
Poderão, sim.
A nota «5 chaveiros» explica-se facilmente visto que não me lembro de ter alguma vez passado quarenta e cinco minutos de um jogo de futebol, e era a minha equipa que jogava, a olhar para as paredes em vez de olhar para o aparelho de televisão, tal foi o desapontamento face ao espectáculo proporcionado.
Quanto à nota «cachecol», escrevi-a de jacto no já mencionado guardanapo quando reparei que me tinha esquecido do cachecol no restaurante onde previamente jantara. E, fazendo um frio dos diabos, como comecei por afirmar, seria da maior conveniência passar por lá no fim do jogo a recuperar o abafo. Escrevi «cachecol», portanto, para não esquecer de o ir buscar.
Na segunda parte, tomei mais notas porque aconteceram mais coisas, nada de especialmente extraordinário, é verdade, mas aconteceram. Resumem-se a isto que todos vocês já sabem: o Benfica marcou dois golos e ganhou o jogo. Houve uma nota que gostei de gatafunhar. Cá vai: «bola para um lado guarda-redes para o outro.» Era para não me esquecer do modo como Lima converteu em golo uma grande penalidade.
À saída, com o sobretudo abotoado até cima à falta de cachecol, quando passei diante do balcão ainda ouvi um cliente dizer para outro:
- A única coisa boa foi não termos sofrido golos a ver se o treinador não tira o Oblak.
Benfiquista que se preze preocupa-se com tudo.
Fonte: Leonor Pinhão @ABOLA
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