O incidente ocorrido no comboio entre Amesterdão e Paris, em que um terrorista foi manietado por quatro passageiros, revela um aspecto que costuma ser pouco referido: estamos perante terrorismo de péssima qualidade. Esta é uma área na qual a incompetência se saúda. O criminoso estava armado de uma metralhadora, uma pistola e um x-acto, circunstância que chama imediatamente a atenção: a combinação de armamento de guerra com material escolar indica uma formação técnica bastante deficiente. Além disso, o terrorista deixou-se dominar por quatro turistas, sendo que um deles era um consultor informático sexagenário. Não deve haver muitas coisas mais humilhantes para um terrorista do que ser imobilizado por um idoso especialista em Java Script. O curso de terrorismo que este delinquente frequentou foi, provavelmente, ministrado por uma espécie de Tecnoforma síria, mais interessada em recolher fundos do Estado Islâmico do que em fornecer formação criminosa de qualidade. (Para efeitos legais, gostaria de declarar que, na minha opinião, os cursos da Tecnoforma eram muito bons, e que o facto de, segundo os jornais, terem sido dirigidos a 1063 formandos para nove aeródromos municipais, sendo que, desses nove, só três se encontravam em actividade, não indica - repito, não indica - que a empresa estivesse mais interessada em recolher fundos europeus do que em transmitir conhecimentos avançados sobre gestão aeroportuária.)
O caso do terrorista frustrado levanta ainda um problema filosófico interessante. O criminoso em causa é um energúmeno incompetente. Tem duas falhas graves: é energúmeno e é incompetente. No entanto, um energúmeno competente, que tem apenas um defeito, é pior do que este, cuja personalidade é duplamente imperfeita. Neste caso, quanto mais defeituoso, melhor. O que nos leva à questão, também difícil, do castigo a aplicar a um delinquente deste tipo. Se a nossa sociedade castiga um terrorista bem-sucedido, talvez devesse premiar, de algum modo, um terrorista incapaz de consumar o seu terror. Até para incentivar o alistamento de idiotas nas organizações criminosas. Se conseguirmos excluir a figura do "génio do crime", tão popular na ficção, e substituí-la, na vida real, pela figura do "imbecil do crime", teremos um mundo melhor. Sobretudo se recompensarmos os criminosos incompetentes do mesmo modo que recompensamos os heróis competentes. As homenagens devem fazer-se em vida.
Fonte: Ricardo Araújo Pereira @ Visão
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