Foi ouvida mil vezes na noite de domingo uma frase que, aparentemente, resumia os sentimentos dos adeptos portugueses na hora do triunfo tendo em conta que o adversário era a França e o local da ação era Paris: "Embrulha, Platini!" e logo se seguia, inevitavelmente, uma série de palavrões de fazer corar o Éder. Vingativos, é certo, os nossos compatriotas entrevistados aos magotes pelas estações de televisão. Os mais velhos não perdoam a Platini o Europeu de 1994, os mais novos não lhe perdoam o Europeu de 2000. Os de meia-idade não lhe perdoam nada.
Vingativos mas desfasados da realidade porque Platini já não é jogador nem presidente da UEFA e vive agora como um sujeito indiciado de crimes graves o que, para nós, deveria ser mais do que suficiente para dar as contas como saldadas. Mas não damos. "Vai-te catar, Platini!", etc… etc… E se aquela bola rematada por Sagna que foi direitinha ao poste da baliza de Patrício tivesse entrado – como todos previmos – ainda hoje e por décadas a vir se diria que Portugal só não foi campeão europeu porque o retirado Platini não deixou.
Na noite de Paris foi, assim, Michel Platini a ausência mais presente do lado francês. Do lado português, a presença mais ausente foi a de Susana Torres pelo menos até ao momento em que Éder, o herói dos heróis, agradeceu à sua "mental coach" – treinadora da mente – todo o trabalho que o conduziu até aquele patamar de glória transformando a simpática ex-bancária que mudou de ramo numa figura de dimensão nacional.
No entanto, não foi apenas Susana Torres a sair deste Europeu com os seus maravilhosos dons certificados pela prática. Também Cristiano Ronaldo se revelou um excecional "mind coach", treinando a mente de João Moutinho para se atirar sem tremeliques à sua grande penalidade no desempate com os croatas e, no dia D, treinando a mente de Éder (que já vinha suficientemente treinada) para ser ele o autor do golo fatal para as aspirações francesas. E assim aconteceu.
Reza e rezará a História que Éder foi o herói improvável desta saga. E foi, dentro do campo, a jogar. Mas quem diria que Cristiano Ronaldo, ‘o autodenominado melhor jogador do Mundo’ como o definiu Cantona, se viria a revelar, fora de campo, sem jogar, como o herói improvável na pele de treinador-adjunto da mente do selecionador principal e treinador de corpo inteiro da mente dos seus colegas de equipa? E com que brilho o fez. E com que resultado! Só por isto merece, no mínimo, duas Bolas de Ouro, uma pelo futebol que joga, outra pela entrega total à sua nova vocação.
No campo dos insultos racistas aos racistas dos franceses…
Os excessos têm sido essencialmente de índole verbal neste transe português. E ainda bem, as palavras voam. O grito vernacular de Éder – que continua autorizado a tudo – naquele momento na Alameda e o desabafo do presidente da República – que também continua autorizado a tudo – anunciando uma ida a Fátima "por conta disto", terão sido os pontos altos dos delírios oratórios destes dias.
É verdade que Portugal é campeão da Europa mas ainda não é um Estado de religiosos nem, muito menos, uma taberna a céu aberto. No campo dos insultos racistas aos racistas dos franceses, Payet é o eleito porque "arrumou" com Ronaldo propiciando-lhe uma noite de glória como treinador-adjunto e não só.
Payet que fez a Ronaldo muito menos do João Morais fez a Pelé no Mundial de 1966 com proveito para as nossas cores e sem que o deus brasileiro conseguisse sequer acabar o jogo a dar instruções ao que sobrava do "escrete". O francês é apenas uma pobre imitação de Morais no século XXI.
Fonte: Leonor Pinhão @ correio da manha
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